segunda-feira, 10 de maio de 2010

Travessia Camocim/Fortaleza




O barco em Camocim

Depois de muito tempo procurando um barco adequado a minhas atividades no Ceará, (velejadas na enseada do Mucuripe, pescarias em mar aberto e pequenas travessias costeiras) localizei, no Maranhão, um catamaran de 23 pés (7 metros), com uma pequena cabine central, que estava à venda no estaleiro que o tinha construído em 2003. O barco havia sido recebido como entrada num barco maior e estava em excelente estado: todo reformado, recém pintado e razoavelmente bem equipado.

Fechado o negócio, encomendei, à veleria BateVento, para a travessia, um enxoval de verão, com duas velas novas, menores que as que vieram com o barco. Acertei com o vendedor que uma tripulação maranhense levaria o barco de São Luiz a Camocim e eu iria, com uma tripulação cearense, buscar o barco em naquela cidade. 

Em 01/05/2010, o barco partiu de São Luiz e, pelo planejado, deveria chegar em Camocim no início da semana seguinte. Para não fazer a tripulação maranhense esperar por nós, parti de ônibus com minha tripulação, já na segunda-feira dia 04/05. Chegando em Camocim, nada do barco... Tentei contato pelo VHF, telefonei para o celular dos marinheiros maranhenses e... nada. Quando consegui contato com o estaleiro, no Maranhão, soube que o barco havia arribado para a foz do Rio Preguiça, em Barreirinhas, com o mastro quebrado, culpa de uma cupilha arrebentada. Retornei a Fortaleza e, quando cheguei, recebi a notícia de que o pessoal do estaleiro estava indo para Barreirinhas consertar o mastro (madeira tem suas vantagens) e uma nova partida iria acontecer na quinta-feira, 06/05.

No sábado, 08/05, partimos novamente de Fortaleza (dessa vez de carro) e chegamos em Camocim exatamente na hora em que o barco entrava na barra. Ajudamos na atracação, instalamos a tripulação maranhense numa pousada para aguardar o ônibus de retorno a S. Luiz e cuidamos de reabastecer o catamaran para iniciar a viagem pra Fortaleza. 

Travessia Camocim/Fortaleza

Primeiro trecho: Camocim/Acaraú

Partimos de Camocim às 11 da noite, após uma correria danada pra reabastecer o barco com mantimentos, combustível (50 l de gasolina em dois galões) e óleo de 2 tempos para motocicleta, já que não encontramos o óleo náutico. Saímos no motor rumo à bóia de entrada da barra, que contornamos aproando para a ponta de Jeri. O vento terral favoreceu, desligamos o motor e aproveitamos a velejada.

Tomamos o café da manhã no través de Jericoacara e, durante o dia, o vento foi aumentando. Seguimos com bordos longos, velejando em vento forte. O barco mostrou todas as suas qualidades de rapidez, conforto e estabilidade. Nesse dia, atingimos, segundo o GPS, o pico de 18 nós.

Por volta de 4 da tarde, atingimos o baixio da região de Acaraú e surgiram os primeiros currais. O Alex (pescador profissional contratado para me ajudar a trazer o barco) argumentou que seria melhor “aportarmos” para passar a noite, porque velejar no escuro, com os currais sem sinalização, seria perigoso.

É interessante comentar a diferença de estratégia de navegação minha e do Alex. Eu havia traçado um rumo mais “por fora” que, se seguíssemos, colocando as marcações no GPS sempre a boreste, estaríamos safos. Já o Alex preferia bordejar mais perto da costa e seguir no visual, velejando só de dia. Ele ganhou.

            Seguimos uma “biana” (barco a vela da região) num sinuoso canal dos baixios e entramos na barra da Ilha dos Coqueiros, no município de Acaraú. A vantagem do baixo calado do barco (40 cm com os lemes recolhidos) é imensa nessas horas. Lançamos poita pertinho do vilarejo, arranjamos um banho de cuia e umas cervas geladas e fomos dormir na companhia dos mosquitos do mangue (nada romântico).

Segundo trecho: Acaraú/Mundaú

Na manhã seguinte, aguardamos os primeiros pescadores saírem para segui-los num novo canal, dessa vez no rumo de Fortaleza. Navegamos sobre o baixio e entre os currais e foi emocionante velejar a 5/6 nós, com apenas 90 cm de água, durante muito tempo.

O vento foi mais brando do que no dia anterior e precisamos dar alguns bordos pra seguir a costa. Chegamos em Mundaú às 19:30 e desembarcamos numa batera que “pedimos emprestado” sem que o dono soubesse. Jantamos, eu fui dormir numa pousada (R$ 15,00 a diária) e o Alex e o Gordo voltaram pra dormir no barco, depois de visitarem amigos locais.

Terceiro trecho: Mundaú/Fortaleza

Acordamos cedo e o barco veio me pegar na praia, bem em frente da pousada. Após livrarmos um baixio e um curral que ficam logo em frente a Mundaú, aproamos a Fortaleza, com vento fraco e, ajudados pelo motor (Mercury 15hp), fizemos o trecho final num bordo só, praticamente reto.

Faltando uns 500 metros para o local de ancoragem, em frente a meu apartamento em Fortaleza, a ferragem do leme de bombordo rompeu-se com um estalo (solda original mal feita). Baixamos as velas, recolhemos ambos os lemes (poderíamos ter prosseguido apenas com um leme) e seguimos guiando com o motor. Aportamos em Fortaleza às 18:46.

Impressões de viagem:

  • Catamaran

    Foi a minha primeira travessia num catamaran. Antes de comprar o “Chaposo” (antigo “Popeye”), tive os monocascos Marreco 16, em Brasília, e um Brasília 27S, com o qual velejei muitas vezes no Rio de Janeiro e região da Ilha Grande. Também fiz algumas travessias em um Delta 32 e num Fast 395, de amigos.

    Meu entusiasmo pelo cat aumentou muito. Velocidade, conforto, segurança, praticidade, possibilidade de navegar em águas rasas e chegar até a praia, são características excelentes desse tipo de barco. O conforto de não navegar adernado faz com que o cansaço da viagem seja mínimo, atenuado, também, pelo fato de se poder circular pelo barco numa posição “mais normal”.

O espaço é ótimo e num barco pequeno (23 pés) podem dormir com conforto 4 pessoas e, querendo, mais alguns, acampados no deck.

Mesmos nos momentos de maior velocidade e ondas altas (1,5 m) podíamos comer com tranqüilidade e deixar os copos com bebidas sobre o isopor, que não havia risco de derramar. O cozinheiro tinha o desplante de deixar as panelas no fogo e fechar o flutuador da cozinha enquanto ficava no deck conversando conosco. A dormida na pequena cabine e até mesmo nos beliches dos flutuadores é fresca e agradável, mesmo na velejada mais radical.

O ponto negativo é que o barco orça pior que o monocasco o que, no entanto, é compensado pela maior velocidade, o que se traduz numa viagem mais curta até o objetivo final. Outro ponto que pode se tornar desagradável, em águas mais frias, é o borrifo gerado pelos flutuadores, quando a velocidade aumenta.

Pesando prós e contras... RECOMENDO.

  • Travessias na costa cearense

    Fiquei encantado com a possibilidade que o formato da costa cearense (côncava ou convexa ?) dá, de podermos velejar sempre próximos à praia,  principalmente num barco de baixo calado. Isso permite que se façam pequenos trechos a cada dia e se escolha uma simpática cidadezinha onde passar a noite ou um fim de semana, numa pousada, se for o caso.

    Outro aspecto interessante é que a perspectiva de ter uma velejada desagradável no sentido oeste/leste, não se confirmou. Embora tenhamos vindo no contravento durante quase todo o tempo, a travessia foi tranqüila e agradável.

    Meu entusiasmo é tanto que penso em montar um esquema de charter para aproveitar esse excelente potencial da costa cearense (vento forte, água morna, cidades interessantes, pousadas baratas, comida boa, etc.). Quem quiser desce e sobe a costa e, os mais comodistas podem ir de barco apenas no sentido da empopada e marinheiros profissionais trazem o barco de volta para Fortaleza.

    Aos amigos interessados, peço que entrem em contato.

Um comentário:

  1. Muito interessante este descritivo da vigem até Fortaleza, gosto muito dos catamarans porém aqui no sul é muito difícil de encontra los. Um abraço.

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